Antes de mais nada, quero deixar bem claro que votei no Lula (2002 e 2006) e, diante das opções disponíveis, não teria dúvidas em repetir os meus votos.
Mas, nos últimos tempos, sempre que o Lula abre a boca em público, especialmente quando faz discursos de improviso, tenho arrepios de preocupação, esperando a próxima gracinha (sem graça), a próxima metáfora futebolística ou o próximo absurdo histórico-político que certamente está por vir.
Achei que já tínhamos atingido o teto máximo com o comentário absurdo feito no ano passado de que, após uma certa idade, a pessoa deixa de lado os extremos político-ideológicos e passa a ser de centro (ou seja, "pelegueia", para usar um jargão político).
Pois bem, ontem o Lula conseguiu se superar novamente. Em discurso (de improviso) realizado numa cerimônia em Minas Gerais, se não me engano, Lula desconsiderou todo o acúmulo de pesquisas, conhecimentos e debates realizados até hoje sobre o tema e afirmou que os "usineiros da cana, antes vistos como bandidos do agronegócio", hoje em dia "estão virando heróis nacionais e mundiais".
Ora essa! Qual o significado da palavra "herói" para o presidente?
Talvez seja o mesmo de Pedro Bial, quando chama de "heróis" os participantes restantes do Big Brother Brasil 7.
Numa tacada só, Lula conseguiu tirar das costas dos usineiros todo o legado de desrespeito aos direitos dos trabalhadores (condições insalúbres de trabalho, baixos "salários", sobrecarga de trabalho, trabalho escravo, mortes, etc.), concentração fundiária (expulsão de pequenos agricultores e posseiros, grilagem, êxodo rural) e destruição ambiental (monocultura, degradação do solo, erosão, agrotóxicos, desmatamento, etc).
O fato do restante do mundo estar interessado no álcool produzido no Brasil torna os usineiros heróis?!?!? Se for assim, esse país está cheio de heróis: os exportadores de soja, de minério de ferro, de carne, etc.
Esse interesse não é gratuito e é fruto de uma crise iminente do petróleo. O principal "ralo" mundial de energia e recursos naturais do mundo, os Estados Unidos da América, precisam procurar uma alternativa barata para o combustível fóssil, que está com os dias contados.
Se essa mudança de matriz energética puder vir travestida de iniciativa ecológicamente correta, melhor ainda. Dois coelhos com uma única cajadada (quase tão eficiente quanto a tacada do Lula).
Mesmo do ponto de vista energético, embora a mídia não discuta isso, mas é importante ressaltar que alguns estudos mostram que cada unidade de energia que o álcool pode gerar, necessitou de 1,2 a 1,4 unidades de energia equivalentes para ser produzida (na forma de preparo de solo, fertilizantes, tratos culturais, transporte, alimentação dos trabalhadores, moagem, destilação, etc). Ou seja, é como se cada litro de álcool demandasse 1,2 a 1,4 litros para ser produzido. A conta é sempre negativa. Por enquanto esse saldo energético negativo continua sendo coberto pelo petróleo, usado na maior parte do processo produtivo da cana. Mas e depois?
Estamos prestes a ver o país virar uma nova "plantation" e, enquanto isso, os usineiros são tratados como heróis.
Lula, por favor, não improvise mais...